quarta-feira, 7 de maio de 2014

Ex-prefeito de Caputira tem bens bloqueados por ordem judicial

O Ministério Público Federal (MPF) obteve decisão judicial que decretou a indisponibilidade de bens do ex-prefeito de Caputira, na Zona da Mata, Jairo de Cássio Teixeira. Ele é acusado de diversas irregularidades na execução de convênio firmado com o Ministério do Turismo para a realização do carnaval de 2008 na cidade.

Também são réus na ação os empresários Madson Rogério Tavares e Ellen Cristina Cunha Rodrigues, sócios da empresa Rogério Tavares Rodeio e Shows Ltda.; a ex-presidente da Comissão Municipal de Licitação, Lindalva de Fátima Mendes Dutra, e o ex-assessor jurídico da prefeitura, Luiz Gonzaga Amorim. Todos tiveram seus bens bloqueados. O valor total do bloqueio determinado pela Justiça Federal de Manhuaçu foi de 280 mil reais.

Caputira é um município de nove mil habitantes, situado no Sudeste de Minas Gerais, a 266 km de Belo Horizonte. Em 2007, o então prefeito, Jairo de Cássio Teixeira, firmou convênio com o Ministério do Turismo, no valor de R$ 70 mil, para a apresentação de shows musicais durante cada um dos quatro dias do carnaval de 2008. Nesse valor, também estavam incluídas a contratação/aluguel de equipamentos de som, iluminação e palco para as apresentações, assim como a divulgação do evento em rádios, jornais, outdoors e cartazes.
No ano passado (2013), o Ministério do Turismo oficiou ao MPF informando que detectara fraude nas fotografias apresentadas pelo município para comprovar a execução do convênio. O relato incluiu ainda inconsistências no Plano de Trabalho e a não realização de atividades contratadas e pagas.
Instaurada investigação, o MPF apurou que os réus haviam seguido em Caputira o mesmo roteiro de irregularidades verificadas em diferentes municípios do país nos casos de fraude com verbas do Ministério do Turismo destinadas à realização de festas e eventos culturais.

Simulação
Como é praxe, o esquema principiou por simular inexigibilidade de licitação para a contratação dos artistas que iriam se apresentar durante o carnaval: as bandas Central Parc, Beijo Apimentado, Pakerê, Pneumania e Forrupaê.

A ação explica que a simulação deve-se ao fato de que a Lei 8.666/93 (Lei das Licitações) somente considera inexigível a licitação quando o contratado for profissional do meio artístico consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública, o que, evidentemente, não era o caso de nenhuma das cinco bandas.

Para o MPF, a falta de qualquer justificativa acerca da inviabilidade da competição apenas evidencia que a inexigibilidade não passou de “subterfúgio operado pelos réus para frustrar eventual competição entre interessados em prestar os serviços almejados, permitindo a contratação direta de empresa escolhida previamente”. Até o preço já estava definido, já que não constou do processo de licitação nenhum documento que comprovasse prévia realização de pesquisa de mercado, conforme exige a lei.

Outra irregularidade que chamou a atenção do MPF foi um parecer do assessor jurídico Luiz Gonzaga aprovando a inexigibilidade de licitação sob o fundamento de que o convênio exigia artistas de reconhecimento nacional, o que, segundo ele, era “respeitado pela licitante”. Ocorre que, até aquele momento, a licitação ainda estava em fase preparatória, ou seja, não havia formalmente nos autos qualquer referência às empresas licitantes.

Falsa exclusividade
Por sinal, a Rogério Tavares Rodeio e Shows Ltda apresentou outro subterfúgio comum a todos os casos de festas realizadas com verbas do MinTur: as chamadas cartas de exclusividade. Esses documentos simulam que os artistas são empresariados pela empresa contratada, quando, na verdade, tal condição só se presta àquele evento específico.

Em Caputira, a prova de mais essa fraude está nas datas de assinatura das cartas de exclusividade das bandas, todas elas posteriores à própria data de celebração do contrato da empresa com a Prefeitura. Ou seja, a contratação da Rogério Tavares Rodeio e Shows Ltda não se deu em razão de ser ela representante exclusiva das bandas, porque, até aquele momento, tal “exclusividade” sequer existia.  “O que se deu, na verdade, foi a escolha prévia, por parte do gestor, da empresa ROGÉRIO TAVARES, e a partir daí, a simulação de um procedimento de inexigibilidade de licitação, a fim de dar ares de legalidade à contratação”, afirma a ação.

É de se ressaltar inclusive que, diante da frequência desse tipo de ocorrência, o Tribunal de Contas da União (TCU), no ano passado, proferiu o Acórdão 5.370/2013 considerando irregular qualquer contratação de bandas de música por meio de inexigibilidade de licitação sob o fundamento da exclusividade de representação.

Há dúvidas ainda em relação à própria realização efetiva dos shows. É que tal execução foi atestada somente por meio de declarações firmadas por representantes dos conjuntos musicais, mas os documentos em nome das bandas Beijo Apimentado, Pakerê, Pneumania e Forruapê foram assinados por uma mesma pessoa, distinta dos verdadeiros representantes. Já na declaração feita pela banda Central Parc, o suposto representante informou um número de CPF que não é o dele; em seu nome, estão registrados dois outros números de CPF, ambos inválidos.

Além disso, o Ministério do Turismo reprovou a prestação de contas por entender que declaração atestando a realização do show, “por si só, não é suficiente para comprovar a execução do item em conformidade com o Plano de Trabalho aprovado”.

Por esses serviços, a Rogério Tavares Rodeio & Shows recebeu 40 mil reais.

Montagem de fotos
Os restantes R$ 30 mil repassados pelo Ministério do Turismo ao Município de Caputira destinavam-se a pagar os serviços de sonorização, iluminação e montagem de palco, além da divulgação do evento. A Prefeitura, então, realizou outra licitação, desta vez na modalidade carta-convite. Foram convidadas três empresas, entre elas a mesma contratada para os shows. As propostas foram de R$ 37 mil, R$ 38 mil e R$ 39,2 mil. Quem venceu o procedimento? Rogério Tavares Rodeio e Shows Ltda.

O MPF concluiu que novamente o procedimento foi forjado. As outras duas participantes, Leo Sonorizações e Promoções Ltda e Sansom Promoções e Produções Artísticas Ltda, apresentaram propostas falsas, e isso foi descoberto porque todos os três documentos que constam do procedimento licitatório eram absolutamente idênticos. Até mesmo um erro de digitação foi repetido nas três propostas.

Outro fato interessante: no mesmo dia 21/08 em que o prefeito autorizou a abertura da Carta Convite, o assessor jurídico aprovou a minuta do edital, o edital foi afixado no mural de avisos da Prefeitura, os convites foram expedidos às três empresas, e, na mesma data, elas compareceram à Prefeitura de Caputira para retirar cópia do edital.

Também neste caso o MinTur reprovou a prestação de contas, porque, a título de comprovação da execução dos serviços, foram apresentadas algumas poucas fotos sem qualquer identificação do evento, local e data de realização. Na verdade, as fotos retratavam blocos de rua, que não condizem com os serviços de sonorização, iluminação e palco para as bandas de música, conforme previa o Plano de Trabalho do convênio.

No que diz respeito à divulgação, que deveria ser feita em rádios, jornais e por meio de cartazes e outdoors, as irregularidades persistem. As inserções em rádio, por exemplo, foram feitas na Rádio Comunitária Alerta FM. Ocorre que, como lembra o MPF, rádios comunitárias não estão autorizadas a veicular nenhum tipo de propaganda comercial.

Mais graves ainda foram as provas juntadas pelo ex-prefeito para demonstrar a divulgação feita por meio de outdoors: ele simplesmente apresentou fotografias fraudadas, em que uma foto do cartaz de divulgação do evento foi superposta à foto de um outdoor qualquer.

Ressarcimento
Em decorrência de todos os fatos relatados na ação, que, além do prejuízo ao erário, violaram deveres de moralidade, legalidade, eficiência, impessoalidade e honestidade na Administração, o MPF pede que a Justiça Federal aplique aos réus as sanções previstas pela Lei de Improbidade, entre elas, suspensão dos direitos políticos, perda da função pública e proibição de contratar com o Poder Público.

Pede ainda que eles sejam condenados, solidariamente, a devolver aos cofres públicos a quantia total repassada ao município de Caputira, que foi de R$ 70 mil, e a pagar multa de três vezes este valor.


Ministério Público Federal em Minas Gerais e Jornal O Tempo

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