terça-feira, 12 de julho de 2016

Palmas para a tocha, vaias para o 'oba, oba'


Por Sérgio Renato


Toda a revolta contra a morte da onça Juma, após a cerimônia de passagem da tocha olímpica pela Amazônia, em junho, é plenamente justificada, tanto que o próprio comitê organizador dos jogos já admitiu que foi um erro expor o animal a tamanho e desnecessário estresse. Deu no que deu. Justificada também em parte é toda a birra de parte da população contra o evento de um modo geral, em razão da crise no país e, em especial, no estado do Rio. O povo tem razão de chiar, mas há um único problema: o foco do chororô.



Sempre muito criativas e implacáveis, as redes sociais estão entupidas de memes engraçados e também mal humorados sobre o tema, alguns pedido até que joguem água no fogo olímpico. E é aí que mora o X da questão. A passagem do símbolo olímpico por diferentes partes do Brasil deveria ser um motivo de enorme orgulho pra todo mundo. Sim, orgulho! – a ponto de ter marcos em cada trajeto apontando que “a tocha passou por aqui”.



Primeiro e antes de mais nada, porque ela representa um mundo ideal e em que todos nós gostaríamos de viver, onde competição entre os seres humanos só haveria em quadras, campos e pistas e, ao final, retornaria e reinaria a harmonia entre os povos. Essa era a ideia original do Barão de Cobertain, idealizador dos jogos da era moderna. E depois porque, mesmo com todos os problemas, essa é talvez a única oportunidade de vermos algo com esse simbolismo em nossa terra – salvo apenas se São Paulo (só ela hoje poderia se organizar pra isso) se preparar para receber os jogos no futuro. Conclusão: o problema não é o fogo olímpico em terras brasileiras.



Então qual é o lance? É o de sempre, o melhor do Brasil (só que não): O brasileiro! Da mesmíssima forma que ocorreu no preparo da Copa do Mundo de 2014, na hora de captar verbas para obras (a grande maioria inacabada até hoje), cada governante quis levar a tocha para sua região sob a alegação que era importante por representar uma parte do país. Até em Fernando de Noronha (?) ela foi parar. E aí tome criancinhas de escolas públicas e privadas minuciosamente ensaiadas na fofura, estrutura de palco para shows (alguns de artistas de peso), interdições de vias urbanas e rodovias importantes e por aí vai até agosto, quando a chama chega finalmente ao Rio. O ápice desse ‘oba,oba’ foi o episódio com a onça Juma, que terminou de forma trágica para o bichinho.



Aliás, ‘oba, oba’ é uma coisa o brasileiro adora, verdade seja dita, e é só por causa disso que a passagem da tocha parece algo que afronta tanto brasileiro diante do caos em que vivemos. Talvez a questão seja que a fogo olímpico merece a reverência, mas o Brasil não merece o fogo olímpico. Portanto, palmas para a tocha, e abaixo ao excesso de confete em volta dela. E por favor: nada de querer jogar água pra tentar apagar o fogo olímpico quando passar por sua cidade. É feio, é brega, pega mal...

Sérgio Renato é jornalista e uma grande amigo do Rio de Janeiro/RJ

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